NÃO ao Novo(??!!) Ensino Médio

O problema já começa com o uso da palavra “novo”. Com certeza, foi o pessoal do marketing que propôs, para ativar alguns gatilhos mentais, pois muitos, imediatamente, se entusiasmam com algumas palavras chave. Novo, por exemplo, por ser antônimo de velho, induz ao pensamento de algo moderno, logo, melhor. Mas, a proposta deste tipo de currículo será realmente nova?

Começo com a minha experiência pessoal. No decorrer da minha vida profissional e pessoal, algumas pessoas comentavam: “ih, a Marla vai contar mais uma história…”. Sim, tenho várias histórias sobre inúmeros assuntos, pois vivi, não somente existi. Então, lá vai.

Sou oriunda da escola pública, desde o prezinho até o ensino médio. No meu tempo (kkkk) o ensino médio era profissionalizante. E como funcionava? Você escolhia a carreira técnica, dentre aquelas oferecidas pelo colégio em que você tinha conseguido se matricular. No meu colégio eram oferecidas três carreiras: Administração, Contabilidade e Secretariado.

Caso você escolhesse Técnico em Contabilidade (lembrando que, na época, o Técnico podia assinar Balanços Contábeis) ou Secretariado, não cursaria Física, Química e Biologia. Em seu lugar, teria disciplinas referentes especificamente aos cursos.

Eu escolhi o curso Técnico em Administração, pois, embora ainda não soubesse para qual carreira prestaria o vestibular, sabia que precisaria dos conhecimentos de Física, Química e Biologia.

Detalhe do curso Técnico em Secretariado: aprender a datilografar era essencial. Entretanto, o Colégio não dispunha de máquinas de datilografia, então os alunos praticavam numa folha de papel, ou seja, a realidade virtual já existia, desde aquela época! Ah, se fosse hoje… Quantos memes viralizando…

A tentativa de especificar qual conhecimento deve ser adquirido pelas classes mais favorecidas e qual pelas classes menos favorecidas vem de longe.

Na reforma empreendida por Giovanni Gentile, ministro da Educação de Benito Mussolini, era reservado aos alunos das classes altas o ensino tradicional, “completo”, e aos das classes pobres uma escola voltada principalmente para a formação profissional.

Em reação a tal ideia, Gramsci propôs a criação de um tipo único de escola preparatória. De cultura geral e formativa, esta teria a função de conduzir o/a jovem até os umbrais da escolha profissional, formando-o/a, durante este meio tempo, como pessoa capaz de pensar, de estudar, de dirigir ou de controlar quem dirige. Em suas palavras propõe a criação de uma “escola unitária” de cultura geral, humanista, formativa, que equilibrasse, de modo justo o desenvolvimento da capacidade de trabalhar manual e intelectual (Soares, 2000). 

“A tendência democrática da escola não pode consistir apenas em que um operário manual se torne qualificado, mas em que cada cidadão possa se tornar governante” (Gramsci). 

Preparar o homem para o exercício de uma cidadania intercultural, não só por meio do incentivo ao conhecimento e reconhecimento do direito à existência de outras culturas e etnias, diferentes daquela em que o educando se encontra diretamente inserido, mas também por meio do estímulo à compreensão e respeito para com estas, fornecendo ao educando certo número de competências, atitudes e habilidades que lhe permita lidar com a diversidade cultural com a qual este se defronta, buscando uma maior integração sociocultural, é hoje um dos grandes desafios da educação (Banks, 1994).

Temos que considerar, também, que qualificações para trabalhos manuais, de repetição, são absolutamente ultrapassadas nos dias de hoje, em função do avanço rápido da automação e da Inteligência Artificial. Os empregos de hoje que oferecem boa remuneração são aqueles voltados à análise de dados, por exemplo.

Um dos engodos da Reforma do Ensino Médio é o tempo integral. Primeiro, porque fica estabelecido que ele é obrigatório, mas, na prática, ele é desejável. Segundo, porque este “tempo integral” precariza o ensino, fazendo com que professores de Química, Física, Biologia, Matemática, etc., uma boa parte até com Doutorado, sejam deslocados para ministrar aulas, ou as também chamadas oficinas, sobre disciplinas que não fazem o mínimo sentido. Um total desperdício!

A Base Nacional Comum Curricular-BNCC afirma, de maneira explícita, o seu compromisso com a educação integral, independentemente da duração da jornada escolar. O conceito de educação integral com o qual a BNCC está comprometida se refere à construção intencional de processos educativos que promovam aprendizagens sintonizadas com as necessidades, as possibilidades e os interesses dos estudantes e, também, com os desafios da sociedade contemporânea.

Será que os estudantes terão que “aprender a datilografar sem máquina de escrever”, pois, como pode haver ensino integral, sem contratação de professores, ampliação de instalações, dos campus, abertura de novas salas de aula, etc.?

No primeiro ano do Ensino Médio, os estudantes, com 14 ou 15 anos, terão que escolher qual itinerário seguirão (como eu no passado: Administração, Contabilidade ou Secretariado). Esta decisão será definitiva em suas vidas. Se, no terceiro ano, o/a estudante estiver pensando em outra carreira, já era, ele/ela não terá como recuperar o conhecimento que não adquiriu nos anos anteriores.

No nosso país, 85% dos estudantes estão no ensino público. Sabendo que milhares de municípios têm somente um Colégio de Ensino Médio, isto significa que, muito provavelmente, o Colégio vai oferecer somente uma opção de itinerário. Não aquela que o/a estudante quer, mas a que o governo local estiver oferecendo.

E os colégios particulares? Alguém duvida que oferecerão a educação completa, com todos os itinerários disponíveis?

Enquanto não entendermos que o desenvolvimento de uma nação depende, fundamentalmente, do nível de esclarecimento do seu povo, será difícil alavancar o mesmo da situação em que se encontra. 

Educação Financeira

Quando falamos em Educação Financeira, o que lhe vem à mente?

Para mim, Educação Financeira é o processo em que um indivíduo busca ou obtém conhecimento para lidar com o dinheiro de forma mais consciente e inteligente. Escrito assim parece fácil, mas, como muitas outras coisas na vida, somente o aprendizado convertido em práticas cotidianas e repetitivas levarão ao melhor uso dos seus recursos financeiros.

E quanto mais cedo começarmos a aprender e praticar Educação Financeira, melhor. E não sou só eu que digo isto. Como explicado no nosso post ˜Educação para vida real` o Ministério da Educação já inseriu este assunto na BNCC-Base Nacional Comum Curricular dos estudantes do Fundamental II.

Leia nosso artigo Educação para vida real.

Alguns acham que Educação Financeira é destinada àqueles que têm dinheiro sobrando. Nada mais equivocado, principalmente no nosso país, onde os empregos formais são poucos e direcionados ã parcela mais abastada da população, os salários são baixos e dinheiro sobrando é raro. Mas é exatamente neste momento que você precisa entender, organizar seus recursos e gastar melhor,

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Minha experiência com crianças entre 10 e 14 anos foi incrível!

No início, desconfiadas. Depois, apresentadas aos boletos e à constatação de que pagamos por tudo. Inclusive que, se continuarmos menosprezando os impactos ambientais que causamos, só respirarão oxigênio bom, os que puderem pagar por isto.

Em seguida, entendendo o que são receitas, despesas e suas classificações, sobre a necessidade de criar, seguir e atualizar o orçamento doméstico, crédito, débito, taxa de juros de empréstimos e de investimentos. Entendendo o valor do dinheiro.

Aí, veio a reunião de responsáveis e alguns contaram sobre conversas adultas que suas crianças tinham tido com eles, transmitindo o conhecimento que haviam adquirido e se oferecendo para ajudar a equilibrar o orçamento familiar. Que orgulho!

Acredito que a grande maioria destes alunos nunca entregará seu dinheiro suado nas mãos de mal intencionados nem farão aplicações em algo que não entendem.

Você entende de ações? Então como pode aplicar em ações? Você entende de criptomoedas? Então como pode aplicar em criptomoedas? Você sabe o que são pedras de alexandrita? Então como você confia numa empresa que diz ter uma enorme reserva deste mineral?

Você acha que entende dos assuntos pelas mensagens de grupos de WhatsApp ou pelas postagens de gente que ostenta para passar credibilidade? Está na hora de mudar.

Educação para a vida real.

Educação financeira e a nova(?) BNCC

No dia 22 de dezembro de 2017 foi publicada a Resolução CNE/CP nº 2, que institui e orienta a implantação da Base Nacional Comum Curricular-BNCC a ser respeitada, obrigatoriamente, ao longo das etapas e respectivas modalidades no âmbito da Educação Básica, no que se refere à Educação Infantil e ao Ensino Fundamental.

BNCC é um documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica. Ela estabelece o conteúdo mínimo. Cada escola prepara seu currículo.

A BNCC estabelece a aplicação do conhecimento na vida real, a importância do contexto para dar sentido ao que se aprende e o protagonismo do estudante em sua aprendizagem e na construção de seu projeto de vida.

Assim, a BNCC prevê o ensino dos Temas Contemporâneos Transversais-TCT que são tópicos que estão presentes em diversas áreas do conhecimento e que são relevantes para a compreensão do mundo atual. Eles permitem que os alunos estabeleçam relações entre os conteúdos das diversas disciplinas e compreendam como elas se interrelacionam.  Os TCT são assim denominados por não pertencerem a uma disciplina específica, mas por transpassarem e serem pertinentes a todas elas.

“O maior objetivo dessa abordagem é que o estudante conclua a sua educação formal, reconhecendo e aprendendo sobre os temas que são relevantes para sua atuação na sociedade. Assim, espera-se que a abordagem dos Temas Contemporâneos Transversais (TCT) permita ao estudante compreender questões diversas, tais como cuidar do planeta, a partir do território em que vive; administrar o seu dinheiro; cuidar de sua saúde; usar as novas tecnologias digitais; entender e respeitar aqueles que são diferentes e quais são seus direitos e deveres como cidadão, contribuindo para a formação integral do estudante como ser humano.”

OS TCT ajudam a desenvolver nos alunos a habilidade de pensar de forma criativa, gerir situações complexas e ter uma visão analítica das oportunidades preparando-os para serem mais competitivos no mercado de trabalho. Essas habilidades são fundamentais num mundo do trabalho já dominado pela automação e inteligência artificial.

Mas, afinal, que temas são estes?

Cada “caixa” acima deve gerar uma disciplina, dentro do currículo de cada escola, que aplique seu conteúdo.

Todos os TCT são importantes, mas, quando focamos na entrada dos jovens no mercado de trabalho, vemos a pertinência do contido na “caixa” Economia.

Certamente, os alunos estarem familiarizados, desde cedo, com conceitos como: orçamento, despesas, receitas, competências pessoais, trabalho formal, trabalho informal, benefícios, obrigações, salário bruto, salário líquido, impostos, etc. os torna muito mais preparados para enfrentarem a vida real.

De acordo com pesquisa da Fecomércio/SP, de 11/2022, 78% da população brasileira está endividada. Será que um conhecimento prévio dos itens acima, teria ajudado a população a gerir melhor sua vida financeira?

O que a escola do seu filho está fazendo a este respeito?